UM CLIENTE
INSATISFEITO
Numa pequena cidade do interior do Nordeste, daquelas cidades
onde na mesma placa que se escreve seja bem vindo já se apresenta de forma
calorosa um volte sempre, inusitadas situações, seja uma festa cheia de
melindres para inauguração de um orelhão e um quebra molas, ou mesmo os tão
corriqueiros conflitos políticos entre situação e oposição.
Um belo dia a obra que há algum tempo elevava os aminos da
comunidade estava quase pronta, o novo cemitério para acalentar, os futuros
defuntos já estava em vias de ser terminado. O cemitério antigo que há tempos
recebia uma população fúnebre que só crescia, já não tinha mais como receber
novos clientes, diziam as, mas línguas, que já se enterrava gente em pé por
falta de espaço, houve até quem relatasse que um morador mandara enterrar sua
sogra de cabeça para baixo.
Pôs
se caso ela cavasse pra sair, segundo ele sairia no inferno.
Mas voltando aos fatos, correu a noticia de que o novo
cemitério recém-criado seria inaugurado, no momento em que algum falecido sortudo
“se é que isso existe “adentrasse aos portões da morte, esse ganharia além de
tratamento fúnebre de luxo, roupas de primeira costura e uma avultosa soma em
dinheiro no caso para os familiares”“.
Boca de litro, um bêbado inveterado residente na cidade disse
consigo mesmo, serei eu o cara de sorte como não tenho família o dinheiro será
enterrado comigo depois saio fora e adeus pindaíba, e assim foi encucando essa
ideia, à medida que os dias foram passando e a obra fora enfim terminada.
Foi então dado o anuncio na radio difusora local o novo
cemitério estava pronto para receber o seu ilustre primeiro residente, nesse
meio tempo a cidade ficou na expectativa, quem seria o sortudo sem sorte que
iria inaugurar aquela grandiosa obra publica. Boca de litro não esperou duas
vezes, e assim deu-se o primeiro caso de overdose de fubuia, jamais registrado
nos anais da medicina forense. O médico da cidade foi chamado, mas em meio a
tantos pacientes, deu o veredicto “como costumeiramente se faz” sem nem olhar o
defunto apenas pelo aparente cheiro de carniça que o oneroso presunto
apresentava:
-Está morto e pelo cheiro há tempos, tratem de enterrá-lo.
Dessa forma tocaram o sino da igreja anunciando a funesta
situação, a qual o povo não sabia se se entristecia ou se comemorava afinal em
cidade pequena qualquer novidade são bem vindos, muitos que nem conheciam o
famigerado boca foram ver de perto quem seria o sujeito que iria ter um enterro
vip.
Boca nesse instante revelou-se um ator que até a globo almejaria,
“claro que o quase coma alcoólico ajudou no disfarce” foi banhado, perfumado,
barbeado, vestido com um terno chique e colocado e um belo caixão de mogno.
Boca tinha uma facilidade latente para improvisar, afinal toda a sua vida foi
na base do improviso e da enrolação, a saída bem sucedida daquela empreitada já
era garantida em sua cabeça.
Todos em frente ao cemitério, os portões se abrem para a
entrada do caixão, e lá vinham alguns vereadores disputando o carregamento do
caixão como que a um troféu, varias pessoas riram da sena, mas logo os ânimos
se acalmaram, e lá estava prefeito, vereadores, babões, padre, beatas, médico,
e em resumo grande parte da comunidade além é claro do ator coadjuvante mente
de toda história sobre falecidos o coveiro, corresponsável pela inauguração da
obra que garantiria o futuro descanso de seus conterrâneos, o qual se orgulhava
de já ter enterrado uma boa parcela da população local e nunca ter ouvido reclamação
de nenhum cliente.
Lá se foi o prefeito discursando, e logo os vereadores
também, começaram a misturar palavras difíceis que eles nem conheciam com
anedotas e frases desconexas então o prefeito toma a palavra novamente:
-Como prometido, nosso querido partidário boca de litro, que
nunca perdeu um comício, como primeiro e ilustre cidadão a fazer-se morto desde
a construção do novo cemitério, local que tenho orgulho de dizer que representa
o futuro de nossa gente, teve todo o seu tratamento de luxo como foi prometido,
porem o dinheiro...
Boca já apreensivo ouvia atentamente cada palavra embora não
entendesse quase nada, mas porem quando o prefeito disse:
-O dinheiro que seria pago a família do finado, como esse não
a possui será gasto na festa de comemoração da inauguração, que muita bebida
seja comprada em homenagem ao falecido, que tinha a cachaça como única família,
agora pregue a tampa do caixão e metam lá na cova que há tempos está aberta.
Qual não foi a surpresa de todos em especial a do coveiro,
quando o boca empurrou a tampa do caixão gritando:
-Se não vou ganhar o dinheiro, pois a primeira lapada de cana
é minha.
Foi um Deus nos acuda, não ficou prefeito, beata, vereador,
babão homem mulher, criança, teve gente que passou mal, no caso o médico, um
paralitico que pulou o muro do cemitério na ânsia de fugir, o mudo que anos
depois relatou essa história, recuperou a fala nesse assombroso dia.
O
que se deu com o cemitério virgem de mortos e o seu primeiro e insatisfeito
cliente, foi algo, completamente inesperado, mas isso, bem isso, já é outra
história.
Autor. Wilton Silva
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